OBS: As imagens foram criadas com Inteligência Artificial para ilustrar o texto.
Acompanhe os primeiros momentos dramáticos do Capitão Pessoa Ramos na Segunda Guerra Mundial. O luto pelos companheiros, a tensão no cockpit e o batismo de fogo sob a artilharia nazista em novembro de 1944.
O Silêncio Antes do Estrondo
É novembro de 1944. O cenário é a Itália devastada. Nos campos enlameados de Tarquínia, homens jovens confrontam a realidade brutal de um conflito que até então conheciam apenas pelos treinamentos. Ali não existe espaço para o erro. A morte não é uma possibilidade distante. Ela é uma vizinha inoportuna e constante. Para o Capitão Aviador Roberto Pessoa Ramos, aqueles dias marcariam a transformação definitiva do homem em soldado de guerra.
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| Imagem ilustrativa com IA |
A atmosfera na base muda drasticamente na primeira semana daquele mês. O piloto observa a movimentação, a ansiedade velada nos olhares e o peso da responsabilidade. Ele foi designado para a “Yellow Flight“, a Esquadrilha Amarela, sob o comando de Joel Miranda. Ao seu lado estão nomes que a história não esqueceria: Ismar, Dornelles, Medeiros, Mota, Brandini, Lara e Rocha. Este último, seu ala, aquele que voaria colado à sua asa, protegendo sua vida enquanto ele protegia a do outro.
Mas a guerra cobra seu preço cedo demais. Antes mesmo que Pessoa Ramos pudesse disparar suas metralhadoras contra o inimigo, o luto invade os alojamentos. No dia 6 de novembro, uma notícia gélida percorre a base. O Tenente Cordeiro não voltaria. Abatido pela artilharia antiaérea quando atacava uma posição em Bolonha, ele caiu nas próprias linhas aliadas. Foi o primeiro golpe. A realidade batia à porta.
No dia seguinte, a tragédia se repete, desta vez com um sabor ainda mais amargo. Não foi o fogo inimigo que levou o Tenente Oldegard Olsen Sapucaia. Foi um acidente durante o treinamento. Ao saltar de paraquedas, a altitude era insuficiente. O solo chegou antes da salvação. Em menos de quarenta e oito horas, o grupo perdia dois companheiros. O silêncio nos barracões de Tarquínia pesava toneladas.
O Ritual da Sobrevivência
Chega o dia 12 de novembro. Para Roberto Pessoa Ramos, aquela data carrega um simbolismo particular. É o seu “dia 12”, o número que o conecta à esposa, Inah, que ficou no Brasil. A missão de estreia o aguarda. Não é apenas entrar em um avião e decolar. É um ritual complexo, quase religioso, de preparação para o desconhecido.
O processo de vestir-se para a guerra é exaustivo. O corpo precisa estar protegido contra o frio congelante da altitude e preparado para o pior cenário: o abate em território hostil. Ele veste a camiseta de lã. As cuecas e meias pretas. As ceroulas e mais meias de lã. A camisa cáqui e a calça do mesmo tom. As botinas com sola de borracha. Por cima de tudo, o macacão de voo.
Ainda não acabou. O frio dos Apeninos exige a camisa de couro forrada com pele de carneiro. As botas de couro. As luvas. Óculos. Capacete. Máscara de oxigênio. No pescoço, a frieza metálica da “Dog-Tag“, a chapa de identificação que dirá quem ele é caso seu rosto não possa mais fazê-lo.
Os bolsos do macacão guardam os itens de quem espera cair atrás das linhas inimigas. Caneta. Lápis. Balas. Chicletes. Um cantil de emergência. Uma bolsa com dinheiro e mapas de fuga. Cartas geográficas. Medicamentos. O colete “Mae-west” para o caso de cair no mar. Ele carrega também três fotografias em trajes civis, para forjar documentos se necessário. A tiracolo, a pistola Colt, carregada, pronta para o combate no solo. Mas há algo que ele não leva. A aliança, a pulseira de ouro e o relógio pessoal ficam guardados em uma caixa, junto com as lembranças compradas em Roma. Para o céu, ele leva apenas o essencial para sobreviver e matar.
O Batismo de Chumbo
O P-47 Thunderbolt ruge na pista. A potência do motor abafa os pensamentos, mas a imagem de Inah surge na mente do Capitão no momento exato em que as rodas deixam o solo. É o último elo com a paz antes de mergulhar no caos.
O voo segue calmo inicialmente. A formação avança sobre o território italiano retalhado por trincheiras e crateras. A missão é um reconhecimento armado. Procurar o inimigo. Atacar. Destruir. A mente de Pessoa Ramos está focada. As manobras são precisas. A cabeça está no lugar, fria, calculista, profissional.
Então, o céu se ilumina. Não pelo sol, mas pela morte que sobe da terra.
A artilharia antiaérea alemã, a temida “Flak“, desperta. Pequenos pontos negros surgem no ar, explodindo em nuvens de estilhaços letais. No início, ele reage com a técnica aprendida. Curvas, mergulhos, evasão. Mas na volta, quando a tensão parecia diminuir e a segurança das linhas amigas se aproximava, o inimigo lança seu último e mais perigoso ataque.
Eles voavam em linha reta. Um alvo previsível. As explosões começam a pipocar ao redor da aeronave blindada. O barulho é ensurdecedor. O metal estremece. É o momento da verdade. O instante em que a invencibilidade da juventude se desfaz.
As granadas rebentam tão perto que o deslocamento de ar sacode o caça de sete toneladas como se fosse um brinquedo. O pensamento é inevitável, cru e aterrorizante. “Pensei na possibilidade de ser abatido”, registraria ele depois. A proximidade da morte tem um cheiro, um som, uma vibração.
Naquele cockpit apertado, cercado por instrumentos e sob o fogo cerrado dos canhões de 20mm, Roberto Pessoa Ramos entende o que é a guerra. Não há glória naquele segundo. Apenas o instinto de sobrevivência e a consciência aguda de que a fuselagem do seu P-47 é a única barreira entre ele e o fim.
Ele pousa. O trem de pouso toca a pista de Tarquínia. O motor é cortado. O silêncio volta, mas agora é diferente. Ele desce da aeronave satisfeito. Sentiu-se bem. O medo veio, mas foi controlado. O batismo de fogo estava completo. O piloto que caminhava de volta para o barracão não era o mesmo que havia decolado horas antes. Ele agora conhecia o som que a morte faz quando passa raspando por sua cabeça. E sabia que, no dia seguinte, teria que enfrentá-la novamente.

